Existe um aspecto na ética de direitos naturais defendida pelos liberais/libertários que constantemente é esquecido, o que constitui uma falta grave: a sua insuficiência dentro da filosofia. E, para que isso não soe provocativo ou ultrajante, trata-se de uma característica fundamental deste sistema ético; afinal, fosse ele pretensamente taxativo e extenso, haveria muito mais possibilidade de falhar e cometer abusos e injustiças. A ética que se arrogasse a tarefa de conter toda a verdade em si própria extrapolaria o limite fundamental da própria ética: sua oponibilidade a outrem, sua obrigatoriedade universal.
Entretanto, ainda que não seja este um defeito, na maioria das vezes é parcamente tratado em livros, artigos e pesquisas sobre o assunto.
É preciso reconhecer e lembrar, sempre, que a única função e aplicabilidade da ética de direitos naturais é a busca da justiça objetiva. Tudo que se tente encontrar além disso usando analogias ao direito natural será uma extrapolação sem-sentido e, na maioria das vezes, prejudicial ao próprio atingimento do que buscam tais mandamentos. Explico-me.
Tomemos por exemplo o caso dos projetos sociais mantidos pelo governo. Obviamente, como o governo jamais produziu e provavelmente nunca produzirá riqueza alguma, como todos sabem, somente pode tirar os recursos necessários para tais projetos de impostos – ou seja, apropriações ilegítimas da propriedade dos indivíduos. Em posse deste dinheiro, o governo promete ajudar os pobres. Não fosse o pequeno grande detalhe de que o dinheiro foi apropriado ilegitimamente, não haveria qualquer problema em se ajudar pessoas que passam necessidade. Mas justamente este fato é o que derruba toda a construção governamental, que normalmente não passa de proselitismo com dinheiro alheio. Através da ética de direitos naturais sabemos que, a partir da apropriação legítima de um bem, este somente poderá ser transferido legitimamente com o consentimento do proprietário, ou por algum mandamento compatível com mandamentos de direitos naturais. Não existe, como sabemos, o dever de ajudar outrem e, logo, a tomada arbitrária de propriedade ou liberdade para este fim não deve ser tolerada, seja pelo governo, seja por uma outra instituição.
O grande problema ocorre quando transportamos este mandamento para o campo da moral e tentamos viver em função deste sistema.
O caso ocorre quando o liberal/libertário acredita que seja completamente normal levar uma vida longe da caridade, ou longe da tolerância social, cultural ou religiosa, por exemplo. Não ter o direito de obrigar indivíduos a cooperarem jamais significará que uma postura irascível e mesquinha deve ser tolerada de bom grado: não deve. Tão importante quanto prezar pela justiça é cultivar, promover e aprimorar o que seja o melhor caminho a seguir. E é justamente disso que trata a moral: ao passo que a ética de direitos naturais nos diz qual caminho não devemos traçar, ou seja, trata de mandamentos negativos, a moral nos indica qual é o melhor caminho a ser seguido, que trará não só frutos indivíduais, mas, principalmente, coletivos.
Em verdade, a nenhum indivíduo é possível viver somente se abstendo de praticar condutas e nenhum indivíduo terá condição de ser plenamente feliz ou realizado se não existe perspectivas do que fazer, ao invés do que não-fazer.